quarta-feira, 2 de setembro de 2015

Jesus chorou

Há um tempo atrás eu havia escrito que em nosso tempo a causa maior de sofrimento e consequentes mortes não eram vírus, bactérias, guerras, pestes, enfim. A causa primeira era amor. Sim, amor, não a presença mas a ausência, ou a incompetência em manifestá-lo. Já ouvi que amor não existe. Existem provas de amor, onde não há provas não há crime.

quinta-feira, 9 de abril de 2015

Essa é minha dádiva, e minha maldição






Depois de tantas palavras. Malditas palavras, que mau uso faz delas. Ébrio, novamente. Fraco, como sempre. O quanto você é responsável por essa merda toda? Eu queria estar presente no dia primeiro que você se calou. Quiçá gritar até ficar rouca. Mandar calar-se, para sempre. Queria estar presente naquele exato momento eu que sua voz foi abafada pelo som produzido pela química embriagante. A agressão sofrida através de palavras descabidas. Posso perceber várias as possibilidades em que você deveria enlouquecer-se antes dele. Um monstro, nascido com sua permissão. Vai tomar no c#! Desculpe. Como dizia. A violência sofrida por aqueles que ainda tinham tão poucas ferramentas para entender tudo aquilo e muito menos para se defenderem. Eram dois, meninos. Eu escrevo do jeito que eu quiser. Vá se f#@%$!!! Ops! Como eu ia dizendo. Naquele tempo esperava-se que a tutora partisse em defesa de seus rebentos. No reino animal é assim. A fêmea sempre protege sua cria. Mas mentiras nunca foram boas armas, nunca, nunca serão. Mentiras são apenas paliativos, remendos, artimanhas feitas para ganhar tempo, até que se pense em algo melhor para se fazer. Eu não creio na evolução, eu entendo a evolução. Isso basta. Com a cabeça daquele tempo os meninos nada tinham para fazer senão esperar de sua tutora uma ab-reação. Contudo só o que eles viam era: silêncio. E junto com o silêncio vinha uma interrogação. Por quê? Mas como sempre o tempo continua sendo um ótimo remédio para curar aquilo que o homem não entende no momento. Com o passar dos tempos ele encontra pelo caminho as peças para completar o vazio do quebra-cabeça. Problemas toda família possui. Pelo menos era isso que o garoto de 7 anos entendia. Mas aquela família não falava sobre o ocorrido. Novamente o silêncio imperava, soberano, e ficava uma ferida. Com o fim do ano as esperanças renovavam-se. E a ferida cessava de doer, pelo menos por uns meses. A voz voltava a se manifestar. E novamente, nenhuma contra-voz surgia para fazer frente aos impropérios que ela pronunciava. Não era só a voz, tinha os gritos, os gemidos, os olhares, os pedidos de ajuda, o choro, tinha tudo isso, e eles só tinham poucos anos. Havia também terceiros que acompanhavam tudo de longe, e eles eram mais velhos que os garotos, e eles diziam que aquilo sempre existiu, desde que aqueles dois adultos jovens resolveram se casar. Maldito dia. Ou será que maldito não era somente aquele dia, será que malditos mesmos sejam as pessoas que conviveram com eles e serviram de exemplo. A raiz é sempre mais profunda, uma atitude tão bizarra assim não poderia ser tão recente. A força que a movia devia ser muito antiga, tudo que é antigo e sobrevive ao tempo tem de ser forte, muito forte. Aos poucos o garoto mais velho foi crescendo e algo dentro dele dizia que aquilo ali não era certo, nenhum pouco certo. Mas os adultos envolvidos continuavam a agir da mesmíssima forma, tanto o algoz quanto a vítima. Hoje me pergunto algumas coisas. É possível que não exista agressor sem uma vítima e que essa segunda tenha total responsabilidade sobre o que lhe ocorre. Como eu disse, uma força como essa não nasce da noite para o dia, ela soma uma mente debilitada, que foi forjada num contexto austero de punição e injustiça. E foi juntando-se a isso acontecimentos que não ensinaram nada para aquele garoto e ele nunca se permitiu perguntar-se se o que ele estava fazendo estava certo ou errado. O problema maior é que eles dois resolveram botar no mundo dois seres que por muito tempo seriam indefesos e absorveriam deles muita coisa, boa ou má. Com os livros e discos o garoto mais velho foi observando e questionando tudo aquilo que o rodeava e o tornava mais forte. Desde muito cedo ele foi obrigado a ter com situações das mais embaraçosas que pediam dele um posicionamento imediato e ele não tinha o devido tempo e preparo para ensaiar uma resposta. E a coisas iam acontecendo, simplesmente acontecendo, ele querendo ou não. Em muitas situações ordinárias ele encontrava-se embaraçado, tinha as mãos trêmulas, a face ruborizada, titubeava diante de situações comuns, onde outros garotos da mesma idade que ele tirava de letra. Ele não entendia, quer dizer, no fundo ele entendia sim, só não queria admitir, ter que botar o dedo naquela ferida fedida. A noite ele tinha pesadelos, criaturas estranhas que tentavam agarra-lo, ele sentia muito medo. Parecia a morte. Acontece que quanto mais ele tentava negar e parecer normal, que tudo estava bem, mas a coisas pioravam. Foi só quando ele aceitou o seu passado que as coisas começaram a mudar para o seu lado. Foram tantas as vezes que pousou de otário, bancou o ridículo, pareceu ser aquilo que não era. E sua existência parecia cada vez mais estranha e vazia. Ele foi percebendo que sua dádiva era também sua maldição(!). E como isso soava estranho. Ele tinha uma casa mas não um lar. Ele encontrava comida na mesa mas nenhum abraço nas horas difíceis. Ele tinha cadernos e lápis novos todos os anos, mas ninguém perguntava se ele ia bem nas aulas. E tudo isso foi forjando seu caráter como um ferro quente que brada a pele de um animal noviço. E seu castigo era continuar vivo, não que ele desejasse a morte, nem tinha recursos mentais para isso, mas ele queria que tudo aquilo cessasse, de alguma forma calar os gritos, todos eles. Era uma maldição que estava se perpetuando na nova geração? Era uma repetição de um comportamento herdado do seu genitor, que por sua vez sofreu com seu próprio genitor? Seria um circulo vicioso que tendeira a se repetir com seu filho? Aos poucos ele foi avaliando todas essas perguntas, para as primeiras ele não podia afirmar nem que sim, muito menos que não, mas quanto a última ele tinha um certeza. Quanto ao seu passado ele nada pode fazer, já está escrito no livro de sua vida, ele não pode apagar as palavras, muito menos arrancar as páginas, ele tem apenas páginas em branco a sua frente. Cabe a ele enxergar-se como um sobrevivente, isso como um maldito sobrevivente de guerra e mesmo parecendo acabada a contenda a noite tem pesadelos com campos minados e granadas sendo atiradas sobre sua cabeça. Esse livro não está acabado. E sua história também não.