domingo, 3 de outubro de 2010

Dedidê II

Sentado ao chão do seu quarto desarrumado, livros por sobre a cama, algumas canetas e papéis ao chão. É uma tarde de domingo, a primavera ainda é uma criança, ele pode sentir o cheiro das flores dos cafezais que sinalizam que no próximo ano a colheita será produtiva e não faltará trabalho pros homens daquela cidade. O garoto tenta se concentrar na leitura daquele texto que foi escrito há mais de cem anos atrás, tenta captar a mensagem que aquelas palavras trazem, ouvir o que tais palavras tem a dizer sobre elas mesmas. Porta fechada, janela aberta, sua mente vagueia pra muito longe dali, já não está mais em seu mísero quarto, já transcendeu as paredes e rompeu os limites do tempo e do espaço. Sua mente passei por lugares escuros, concebe possibilidades, considera possíveis ideias, tenta decifrir códigos, palavras e se sobrar energia decifrar seus próprios sentimentos, pra talvez um dia fazer isso em benefício de outrem. O garoto pensa, e isso é melhor do que nada. Enquanto outros são programados pela programaçao alienadora da televisão aberta, ele se dedica a ler sobre personagens do século passado, dos quais sua história de vida e idéias muito tem a ver com suas próprias. Meu caro, existir lhe custa muito esforço racional, lhe custa muita energia, malhando a ferro em brasa, não cessa um instante, mesmo dormindo ele vagueia, nao sabe muito bem por onde, mas vagueia. Faz isso na tentativa de encontrar algum semelhante, alguma alma que sangre da mesma forma que ele. Sente dor, sente desespero, angústia, raiva e frustração, tudo junto, ao mesmo tempo, em doses magistrais. Demônios, velhos demônios sempre voltam a lhe assombrar, sussurrando ao seu ouvido coisas miseráveis. O paraíso é logo ali, o inferno também. Eu falo daquele ao qual os demônios nunca largaram, mas que no fim verá que deve muito a eles. Um ronco estranho, ah, é o estômago reclamando por comida e o corpo por energia, afinal, pensar lhe custa muita energia, muita. O garoto se levanta, organiza os livros e os papéis, vai ate a cozinha e apanha algo pra cessar sua fome, mas há uma coisa que parece nao cessar nunca - pensar - isso sim nao cessa nunca, nunca.
Por Fabio Silva.

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