terça-feira, 7 de dezembro de 2010

Escrita de livre associação


O que você terá pra me dizer? Me diga. Diga-me que terei um futuro brilhante pela frente. Me tornarei forte, justo, corajoso, digno de merecer a vida que tenho. Eu como o único responsável pela minha própria condição. Ontem o menino amedrontado, hoje o quase-homem que procura redenção pelos seus erros e fraquezas do passado. Diga-me garoto, o que lhe faltou quando criança? Carinho, compreensão, afeto, cuidados, adjetivos tão conhecidos pelos adultos, mas tão em desuso. O excesso de punição, muitas vezes por atos banais ou por nem mesmo merecer. O excesso de exigências, a cobrança por um alto desempenho sempre, ser tão exigido desde muito pequeno, eu sei, você quase sucumbiu. A chacota dos amigos na escola e na rua. Confiança depositada inocentemente em pessoas que não mereciam nem mesmo sua atenção. E você foi crescendo meu garoto, rompendo as barreiras impostas pelas circunstâncias, derrubando gigantes, vencendo os próprios medos, derrotando os demônios que habitavam e ainda habitam sua alma, conquistando novos repertórios comportamentais para melhor enfrentar a vida. Enfim, a cada esquina uma nova aventura, e foram tantas, em quantidade e intensidade. E você mal sabe que há tantas outras ainda por vir. Algumas garotas, mãos trêmulas na maioria (senão todas) das vezes, a verborreia, e noutras o silêncio constrangedor. Eu sou assim, tímido, tenho vergonha, não por charme ou por escolha, mas porque as circunstâncias me vez comportar-me desse modo. Ei garoto, os tempos na escola, toda idade com seus prazeres e medos, foi assim. Tanto conhecimento descoberto, tantas habilidades desenvolvidas, a inatas e as adquiridas. Os relacionamentos interpessoais, disso não se tinha aula, só provas práticas, ou se era aceito, ou se era reprovado, para sempre, sem oportunidade de segunda chamada. Ele aprendeu, adquiriu habilidades, tomou por poder outras mais. Menino, muleque, meu guri, o filho amado, expectativas à seu respeito. Ninguém o ouvia, não escutava o que o garoto tinha a dizer. Afinal, como toda criança, ele não era um adulto em miniatura. Deparava com situações pela primeira vez, não sabia o que fazer, o que dizer, como se portar, não sabia traduzir os olhares, ler nas entrelinhas, entender o não-dito pelo dito. Inevitavelmente só aprendeu errando, falhas necessárias para o seu desenvolvimento, tudo isso torcendo para o mínimo de prejuízos. As brincadeiras, o futebol com os amigos, as conversas sobre o mundo e a cultura que ele estava inserido, os desenhos animados, tudo muito bom. Diga-me garoto, de uma só vez, sem pestanejar, tudo aquilo que você aprendeu, aquilo que você ignorava e agora tem o domìnio. Diga-me de um só fôlego, todas as emoções e sentimentos que fizeram seu coração acelerar e pulsar mais forte. Diga-me garoto, que antes você se intimidava e se colocava em menosprezo ao estar numa sala frente à pessoas até então desconhecidas, e atualmente você se porta como um guerreiro valente e corajoso, que enfrenta tudo e todos que lhe cruzam o caminho. Antes o cãozinho amedrontado que se encolhia e tremia num canto qualquer, hoje o cão raivoso, sedento por atividade, violento quando se deve ser, grunindo por um mundo mais justo. Antes a ignorância que amedrontava, hoje a posse do conhecimento que liberta o espírito que anseia por liberdade. O que você vê pela janela, diga-me garoto, espero por uma palavra sua. Sob ataques de inimigos, que não são tão inimigos assim. Todo homem mata aquilo que ama, e a par do amor, é esperável que alguém nos magoe, tenha ciência desse fato, tome nota. Anda, apresse por aprender mais essa lição. Já está anotando? Não? Pegue os livros esquecidos na estante, eles tem algo muito importante a lhe dizer, desligue a televisão, vá à missa com seus pais, preste atenção nas palavras do sacerdote, e quando estiver mais crescido, não se furte do direito de questionar e criticar todas aquelas palavras. Anotando? Espero que sim. Não acredite nos elogios, verifique antes quem proferiu tais palavras, quais eram suas reais intenções. Palavras podem vir encharcadas de sarcasmo, ironia, blasfêmia, cinismo, e você terá que separar o joio do trigo. Você será enganado, traído, logrado, mal-compreendido, injustiçado, encurralado, agredido, desrespeitado, e terá que se haver com todos esses fatos. Lembre-se, uma certa dose de agressividade sempre cai bem nessas horas, sempre. Ah, seus telefonemas não serão atendidos, seus apelos serão desprezados, seus sentimentos menosprezados. Entenda, na sua maioria essa vida NÂO é justa, agradável, confortável, doce, calma, paciente, prazerosa. Tudo depende da sua postura diante da vida. Pode-se se deixar derrotar, colocar a culpa no presidente, na professora, na esposa, no cachorro, em deus, tudo isso só servirá pra uma única coisa: tirar a responsabilidade pela sua condição de suas costas, e consequentemente colocar o poder de mudar sua vida na mão de terceiros. Persiste meu guri, persiste. O importante de toda viagem não é a chegada nem a partida, mas a travessia. Já lhe disse sobre os males e os desprazeres dessa vida, agora chega a hora de mostrar-lhe que a vida tem muitos atrativos interessantes. O abraço apertado daquela garota dos olhos doces. O bom papo com um ansião. Conversas entre amigos, a relação das amizades, o companheirismo, o apoio, o poder contar um segredo, um medo, uma fraqueza. Compartilhar momentos felizes. A inocência das crianças, a beleza por trás daquele sorriso puro. Tenha certeza, toda aquela atitude que houver carinho, afeto, atenção, amor, benefício mútuo, relação de ajuda e camaradagem, tudo isso será válido. Terá valido a pena, terá recompensa o sofrimento, a dedicação, o sacrifício. No fim das contas não importa muito o que você espera da vida, e sim, o que a vida espera de você. E de toda essa divagação ficaram duas coisas: a certeza que estava sempre recomeçando, e que seria interrrompido antes de terminar.

Por Fabio Silva.

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